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Homem com “R”…de reflexivo

In Arts & Letters, Creative Writing, Fiction, Humanities, Literature on June 24, 2015 at 8:45 am

Hugo Santos

Hugo Santos é professor de Literatura no Brasil e possui os cursos de Graduação e Mestrado em Literatura Brasileira, ambos conseguidos pela Universidade Federal de Pernambuco, no estado de Pernambuco, cuja capital é Recife – sua cidade natal (e de acordo com ele mesmo, uma das mais belas cidades do país). Atualmente, ele está frequentando o Programa de Doutorado em Educação de Adultos, na Universidade de Auburn, onde também é professor de Língua Portuguesa e Cultura Brasileira. Além disso, ele está representando o Governo de Pernambuco na iniciativa de se estabelecer uma parceria entre a UA e a Universidade do Estado de Pernambuco, através do estabelecimento, troca e ampliação de pesquisas que permitirão a alunos e professores das duas instituições explorarem o que cada uma tem para oferecer. É autor de “Um Céu Imenso.”

Hugo Santos is a Professor of Literature in Brazil and received both his undergraduate and master’s degree in Brazilian Literature from the Federal University of Pernambuco, in the state of Pernambuco, located in the Northeast of Brazil, whose capital is Recife—his hometown (according to himself, one of the most beautiful cities in the country). Currently, he is enrolled in the Ph.D. Program in Adult Education at Auburn University and teaches classes in Portuguese and Brazilian Culture. He is linked to the Auburn University Office of the International Programs as a representative of the Government of Pernambuco and is establishing a partnership between Auburn University and the Pernambuco State University, where he worked in Brazil. The research exchange and extension program enables the students and teachers of both institutions to explore what each university has to offer. He is the author of Um Céu Imenso (“An Immense Sky”).

 

O pior de você acordar de manhã, quando sequer dormiu, é o momento em que se dispersam as nebulosas lembranças de que tudo não passou de um sonho, e se retorna à cruel e surpreendente realidade.

Qual realidade?

A que descobri – que sou feio, asqueroso, preguiçoso e infiel. Tudo isso de acordo com a composição de uma senhora, num programa de televisão.

É lógico que diante de tamanha descoberta me vi obrigado a buscar ajuda, e procurei a principal pessoa a quem recorrer nessas horas – minha mãe. Pois é. Nada de atitudes precipitadas, partindo pra aconselhamentos psicológicos ou perguntando pra antiga namorada. Nada disso. Buscar na santa mãe o aconchego de palavras de conforto é o remédio ideal pra esse tipo de pós-trauma.

E não é que a coisa começou a mudar? Após repassar-lhe toda sorte de desqualificações, termos pejorativos e adjetivos depreciativos, lançados sobre mim pela impetuosa dona-de-casa, ela fitou-me nos olhos e disse-me duas coisas. A primeira – “Rosamunde e Clarice podem responder-lhe melhor que eu.”; a segunda – “Estou atrasadíssima para o supermercado.”

Não preciso nem dizer que só a deixaria sair daquela casa, entrar naquele carro e ir às compras, depois que me dissesse onde eu encontraria aquelas suas amigas, ou vizinhas, sei lá, chamadas Rosamunde e Clarice; qual rumo eu deveria tomar, em qual bairro ou clínica deveria procurar, afinal estava em jogo a elevação ou execração da auto-estima de um verdadeiro homem.

A paranóia delirante já me tomava, quando, enfim, minha mãe me esclareceu tratar-se de Rosamunde Pilcher, escritora escocesa, autora de inúmeras obras literárias, dentre elas “Setembro” e “O Regresso”, e Clarice Lispector que, lógico, dispensa comentários.

Evidentemente que procurei, dali mesmo, respostas delas para o meu escárnio. Não precisei demorar muito. Encontrei em suas obras algo que dito, apenas, não seria o suficiente. Teria de ser escrito. E escrito por duas mulheres maravilhosas, com o propósito de ser perpetuado, de acalentar sonhos e remediar controvérsias.

E se eu tivesse o dom delas, com suas sagazes visões de mundo, sei até o que escreveria, para leitura de reles mortais como eu. Inspirado em Rosamunde, escreveria:

“… seguramente Deus se utilizou também de seu arcanjo mais fiel, seu mais atento mensageiro e sua onipotente graça na minha criação. E quando digo “minha”, o faço desconsideradas as profusões feministas, referindo-me ao macho, em seu gênero mais específico. Eu sou este ser belo, que encanto pelos meus atributos e me completo pelas minhas ações. Qual mulher, independente de cor, classe ou paixão, não vê a minha boca como fonte intangível de magia e que não sente meu beijo como um gosto de vida e de nostalgia?

O meu corpo, visto sob um ângulo eminentemente feminino, e guardadas as óbvias exceções, representa os eternos Adônis e Apolo, moldes da beleza masculina. Em essência, representa também o Norte, o objetivo, o caminho e o desejo da alma feminina.”

Reerguido meu ego e restaurada minha auto-estima, e tendo incorporado o espírito clariceano, escreveria:

“ O que seria eu, afinal?

Seria eu, de fato, obra de Deus?

Teria eu sido uma composição da Natureza, para que a síntese da beleza fosse igualmente dividida?

Ou teria nascido de um raio de luz? Mas aquele primeiro raio do dia. Aquele primeiro raio de sol que, quando vemos, temos a certeza do milagre de cada amanhecer?

Importa, porém, que eu existo.

Que existem problemas é certo, mas existem tantas virtudes…e tantas.

Existem meus sorrisos e encantos; minhas mãos, meus toques, minha fala e meu beijo.

Existe a obra harmônica, a obra humana e a obra visual.

Existe ‘Eu’, afinal.”

E então, lendo estas passagens, apenas uma coisa me viria à mente – eu poderia ser mais reflexivo.

Eu poderia ser também mais poesia, mais atenção às pessoas que me cercam, mais “toque” naqueles que amo e quero bem, mais presença com Deus, mais afago na cabeça do meu pai.

Eu poderia ser, muito mais, o homem que eu deveria ser.

 

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